segunda-feira, 31 de março de 2008

Março, a retrospectiva

Depois de pouco mais de um mês nas aulinhas de tênis, aprendi que a terminação dos golpes (o movimento que você faz com a raquete depois de bater na bolinha) é muito importante, sobretudo porque direciona melhor a rebatida.

Tá, e o que isso tem a ver com a vida real? Eu explico. Em mais uma segunda-feira de folga, acabei me pegando na mesma situação que no finalzinho de fevereiro: deitado à beira da lagoa do Parque do Ibirapuera. Foi uma terminação legal para fevereiro e uma base para um mês de março que foi bem legal. E hoje, justamente no dia 31 de março, lá estava eu repetindo a terminação. E isso me fez pensar um bocado.

Naquele dia de fevereiro, mal sabia eu o que me esperava nas próximas semanas. Apenas estava deitado na grama pensando que rumo a minha vida poderia tomar. Claro que errei todas as previsões e nem sequer acertei 1% de que rumo março tomaria.

Agora vocês se perguntam: que rumo março tomou, cara pálida? Pois eu respondo com uma nada pequena retrospectiva cheia de links do Cavaleiro com Solitária.

...

Comecei o mês acordando cedinho e indo para o CCT da Barra Funda do São Paulo, quando o Adriano deu piti com a imprensa e reivindicou o título de Imperador. E ainda do treino do São Paulo escrevi o primeiro post do mês, contando a minha conversa poliglota (em inglês, português, espanhol e italiano) com um italiano.

E por falar em trabalho, vivi um dos meus melhores momentos profissionais logo no dia seguinte, quando fui escalado para cobrir o clássico entre Corinthians x Palmeiras no Morumbi. Ainda naquela semana, fui a uma pauta da seleção olímpica brasileira de remo e, com exclusividade, noticiei a iminente aposentadoria de Thiago Gomes (uau!).

Outro ponto que merece destaque rolou no dia 16, quando cobri o tour do Zidane pela favela de Heliópolis e pelo Clube Paineiras. Embora tenha feito expediente triplo, vi de perto o craque carequinha e, no dia seguinte, ainda fui entrevistado ao vivo no BandSports pelo Erick Beting.

Resumindo, tive um mês muito bom profissionalmente falando. Mas o mais legal de março é que ele foi bem diferente dos demais meses que eu já vivi: sempre achei que não era possível ser feliz dos campos profissional e pessoal ao mesmo tempo. Ainda bem que eu estava enganado.

Março reservou algo inédito para mim: viagens. Foi o mês em que eu mais peguei estrada, totalizando duas viagens inteiras (em nove feitas por mim até hoje). Uma delas, inclusive, marcou a minha estréia on the road em feriados prolongados e em outra, presenciei o quase fim de um eucalipto em Jacareí. Também aproveitei um dia de folga para curtir uma de mochileiro pela estrada. Além disso, conheci a rodoviária do Tietê, a Via Dutra, pessoas agradabilíssimas, observei reencontros no interior. E fiz até uma amizade com uma funcionária de rodoviária. Bacana.

Em São Paulo também tive bons momentos. Retornei à praça nos arredores da Paulista que serviu de cenário para a trilogia Praça de Pedra, no ano passado, e tive uma tarde sensacional. Ainda fui apresentado a um bar/padaria nos arredores, o Xodó Paulista. A noite terminou com uma janta no Domino’s e o início de algo que se assemelhou a uma paixão ao som de Liverpool, com uma garota que soube da minha existência por ser leitora deste blog.

Também consegui terminar um livro inteiro pela primeira vez no ano. Não conseguia ler um livro do início ao fim desde dezembro, quando li o sensacional Dias, do Fábio Matos (atualizado e corrigido, com apenas um T) e fiquei mal-acostumado. Depois disso, até tive um sonho maluco, em que eu ficava calvo.

Mas é claro que março não foi perfeito, e vivi momentos desagradáveis. Além de sofrer meu primeiro furto em 19 anos, perdendo minha carteira e meu ipod (in memorian), ainda passei por alguns maus bocados. Precisei fazer uma ligação de emergência e não pude, além de ter vivido situações bem tristes como esta e esta aqui, no fim do relacionamento ao som de Beatles.

Mesmo assim, não tenho por que me arrepender de março, que marcou também o aniversário do meu xará chileno. Nos últimos 31 dias, estreitei ainda mais os meus laços com a minha sapientíssima mãe, voltei a falar com meu pai após mais de dois anos e, depois de uma filosofada com um segurança do trabalho, percebi que o importante mesmo é viver a vida intensamente, cada momento.

Março foi bem bacana. Percebi isso quando estava no ponto de ônibus esperando para voltar pra casa e estava subindo e descendo na ponta dos pés, quase dançando ouvindo Help! Uma terminação muito boa de um mês extremamente bom. Impossível não criar expectativas para abril.

...

Como vocês devem ter percebido, novas ‘aquisições’ foram feitas em março para reforçarem a seção ‘Valem o dobrão’ deste humilde blog. Em ordem cronológica, apareceram por aqui o Blog da Lui, da divertida Luísa Pécora; o Devaneios Cinematográficos, da Carol Arice (conterrânea do eucalipto da Dutra) e o When I’m 64, da tão viciada em café como eu Camila Mamede.

domingo, 30 de março de 2008

Papo de recepção

Nunca botei muita fé em ter um papo inteligente e intenso às sete da manhã em um domingo. Mas como tudo é possível no universo paralelo da Avenida Paulista, acabei quebrando a cara há duas semanas.

Ao chegar na recepção do prédio do trabalho, encontrei o segurança que sabe meu nome embora eu não saiba o dele (sim, eu tenho vergonha de perguntar o nome dele mesmo depois de um ano lhe dizendo bom dia diariamente) e pedi pela chave da redação. Enquanto preenchia a planilha com horário, meu nome e a minha assinatura, o tal segurança puxou assunto.

“Cara, já é 16 de março. O tempo voa!”. Preparado para receber um clichê do tipo, respondi outra frase feita a ponta da língua. “É... e parece que o ano começou ontem. E pensar que daqui a pouco chega julho, agosto... e em setembro o ano já acabou”, redargüi. Era um papo normal até então, não fosse o carismático recepcionista improvisado decidir prolongá-lo. E muito bem, diga-se.

“É por isso que a gente tem que saber aproveitar o tempo da melhor maneira possível, né? Às vezes o cara fica aí, falando que não curtea vida e nem nada, não junta dinheiro, tira férias e não viaja...”, filosofou, até ser interrompido por mim.

“Pois é. E aí volta ainda mais estressado do que antes. E ainda pior, porque não vai ter a expectativa pra sair de férias”, emendei. A resposta do segurança me surpreendeu. “É por isso que a gente tem que aproveitar cada momento, cada segundinho da nossa vida, né não? A gente nunca sabe quando vai ser o último segundo, né? Aí quando a gente abre o olho, diz que o tempo passou rápido e reclama que não aproveitou nada. A gente tem que curtir tudo o que passar pela nossa vida...”, argumentou, antes de ser mais uma vez interrompido pela minha pessoa.

“... viver com intensidade, né? Pra depois não ficar reclamando da vida, mas sim se orgulhar de tudo o que a gente fez. Tudo passa muito rápido e, se a gente não souber perceber o que acontece e tirar do momento apenas coisas boas... enfim, vai se pegar reclamando da vida à toa”, vislumbrei.

“Falou tudo, Felipão, falou tudo”. “Que é isso, campeão. Bom dia e bom trabalho, cara. Mas ó, daqui a pouco eu passo aqui em agosto e você vai dizer 'pô, já é agosto' e blablablá. Aproveita o tempo, pô”. “Você também. Vê se aproveita a tua vida, Felipão”.

Filosofei em um domingo às sete da manhã. Aproveitei cada segundo a partir de então como se fosse o último. E não me arrependi.

sábado, 29 de março de 2008

Fazendo boas ações (para quem não quer recebê-las)

Toca o telefone no sábado à noite. Amigos do outro lado da linha: “A gente tá indo praquele bar na Vila Madalena e vai passar aí na Paulista daqui a pouco pra te pegar. Fechou?”. Minha resposta não poderia ser outra que não “Foi mal, cara, mas não vai dar. Hoje tá bizarramente corrido aqui e eu vou sair da redação bem tarde. Mas final de semana que vem, certeza, a gente toma umas e outras”.

E essa foi a tônica do meu sábado. Eu, que até estava com uma certa vontade de sentar em uma mesa de bar para tomar alguma coisa gelada para deixar a minha garganta ainda mais dolorida e contar histórias, acabei ficando com um versinho bem famoso na cabeça: It’s been a hard days night and I’ve been working like a dog.

Mas eu não era o único que trabalhava como uma mula no sábado à noite, e todo o pessoal da redação que estava no mesmo barco se reuniu e fechou uma pizza. Em um ano e meio de Gazeta, foi a primeira vez que participei do famigerado rateio da redonda, famosa nas rodadas de quarta-feira à noite. Algo inédito, veja você!

Pois bem. Aos poucos as pessoas normais e com família a zelar foram indo para casa. Restamos na redação William ‘Shrek’ Correia, com o resumo da rodada do Paulistão, e eu, com a honrosa ida do Ricardo Mello à final de um torneiozinho mequetrefe de tênis no México. Isso às 23h45 da noite.

Após encerrarmos a labuta sabatina, desligamos as televisões e vimos que três pedaços de pizza não foram consumidos. Por consenso, decidimos levá-los e dá-los a algum mendigo no caminho até o metrô. “Mendigo na Paulista é o que não falta nessa hora”, concordamos.

Mas foi quando pisamos na calçada em frente ao número 900 que olhamos para o escadão e não vimos um mendigo sequer. O Shrek até brincou: “só falta a gente não encontrar mendigo hoje, quer ver?”. Continuamos andando. Atravessamos a Joaquim Eugênio, passamos em frente ao McDonald’s... nada.

Demos mais alguns passos e nada de moradores de rua. “Quer ver? Não vai ter ninguém!”, prosseguiu o Shrek. Viramos no cruzamento com a Brigadeiro: “Ah, aqui sempre tem uma galera dormindo”, lembrei. Mas não neste sábado. Nem na frente da Drogaria São Paulo tinha alguém.

Droga. Era meia-noite de sábado para domingo, eu estava saindo do trabalho e tinha uma pizza nas mãos. Claro que as pessoas esquisitas que passavam pela gente na Paulista me olhavam com cara ainda mais estranha. Normal. Estávamos quase resignados de voltar com a pizza para casa quando o Shrek lembrou: “Não, pelo menos o cara que fica na estação Brigadeiro tem que estar lá”. “Quem, o tiozão barbudo da meia?”. “É, isso. Se ele não estiver, não tem mais mendigo hoje”.

Mas o tiozão barbudo da meia não estava lá. Medo. Conseguimos, por sorte, avistar um mendigo do outro lado da rua. Atravessamos a Paulista e demos a tal pizza para o cara que, incrédulo e talvez um bocado bêbado, não sabia se deveria aceitar. “Mas... tudo pra mim?”. “Sim, pode pegar... bom apetite e boa noite”, respondi, com um sorriso empático no rosto.

Fazer boas ações é bem legal e gratificante, mesmo depois de um expediente insano em uma noite de sábado. E mesmo com poucas pessoas dispostas a receber uma boa ação.

sexta-feira, 28 de março de 2008

O que os seguranças não vêem

Saguão de entrada de uma rodoviária qualquer, em uma cidade qualquer do interior do Estado. Uma manhã durante a semana. Um feriado.

Sob um câmera de segurança, que faz incansáveis e ininterruptos giros de 360º em torno de si mesmo e intimidando os demais, há uma mulher. Com óculos escuros de grife na testa, ela fica à espera de algo. A mão direita, trêmula, aperta ora com força e ora sem a alça da mala de carrinho. Bem perto de onde há um adesivo com as siglas GRU – BRA.

O sol forte, o bafo quente e a luz daquela ensolarada daquela manhã de feriado fazem brotar uma gota de suor em sua nuca. Desce alguns centímetros e morre em seu casaco de pele – que, por sua vez, combina com as calças jeans, as botas grossas... em poucas palavras, vestia-se como uma chique mulher ao estilo europeu.

Fria, mexe-se apenas quando um carro abre as portas à sua frente. Seu movimento, embora force apenas 17 músculos da face e mostre os belos dentes, é verdadeiro. Dele sai um homem que retribui o sorriso intenso e belíssimo que recebe.

Ambos dizem ao mesmo tempo um “Nossa, dois anos!”, entram e continuam conversando (mas agora são inaudíveis, pois os vidros levantados impedem que os outros ouçam os já esperados “Como você ta?”, “E aí, que tem de novo para falar?” e muito menos o verdadeiro “Puxa... que saudades!”). O carro parte.

E a câmera de segurança, em seu giro mecânico, não registrou o reencontro daquele casal, que talvez reatava um relacionamento após tanto tempo e tantos mil quilômetros de separação. Em sua mira, neste momento estava apenas um cara sentado sobre a sua mala e que, à espera de algo que mudasse a sua vida, fantasiava uma história e escrevia suas bobagens em um bloquinho de papel . Um desperdício por parte da câmera.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Questões capilares

Aquilo que eu mais temia aconteceu. E justamente em um dia desses de manhã, quando eu menos esperava (por mais constrangedor que possa parecer, vou contar tudo da forma como as coisas se sucederam, sem rodeios).

O dia não havia ainda ultrapassado as sete horas quando meu cachorro começou a chorar à porta do meu quarto. Ciente que eu estava lá enclausurado, o massacote pedia por companhia e, ao mesmo tempo, pelo conforto de dormir na minha cama, sobre as minhas canelas.

Levantei meio cambaleante e abri a porta. Enquanto o cão corria para se perder entre o cobertor da minha cama, passei antes no banheiro para tirar o aparelho móvel que machucava a minha gengiva e para fazer um bochecho rápido. Mas, ao me olhar de relance no espelho, notei algo diferente.

Não, aquele do outro lado do vidro não poderia ser eu. Estranho. Era o mesmo olhar, o mesmo narigão, o mesmo contorno do rosto, o mesmo pescoço comprido, a mesma orelha, o mesmo sorriso mambembe... mas não me identificava comigo mesmo. Faltava algo em minha cabeça. E eu logo percebi: cabelos.

Como assim? Nunca havia percebido que meus cabelos tinham começado a cair. Quer dizer, vez ou outra eu notava uns fios sobre os teclados dos computadores do trabalho e de casa. Mas... era um fiozinho aqui, outro ali... nada de mais. Como não havia notado o começo das entradas? E... e como não havia notado essas falhas que mostravam o couro cabeludo? E como meu pai mentiu pra mim aquele dia 15 anos atrás, quando disse que eu não ficaria calvo por causa da genética?Não era possível, eu estava... eu estava calvo.

Eu estava calvo. E justamente eu, que sempre tive uma cabeleira hirsuta, volumosa e rebelde. A partir de então, deveria dividir os fios, alocar um aqui, cobrir um vãozinho com outros ali... tudo para tentar esconder essa calvície que eu não havia notado anteriormente.

Era uma nova vida que se iniciava naquela manhã. Eu, calvo, teria como esconder essa careca? Boné? Não, muito informal pro trabalho. Boina? Não... ainda não tenho idade para isso. Chapéu? Ah, qualé, estamos no século 21!

Restou-me, então, ficar conformado e voltar para a cama. Dormi mais alguns instantes, acordei apenas com uma amiga no telefone me chamando para um almoço. Pensei em contar-lhe a notícia, mas preferi não falar nada. Quer dizer... ela me via quase todos os dias, já deveria ter percebido o que eu não havia notado.

Levantei, abri a janela do quarto e, no reflexo do vidro, notei algo diferente no meu rosto. Não, aquele do outro lado do vidro não poderia ser eu. Estranho. Era o mesmo olhar, o mesmo narigão, o mesmo contorno do rosto, o mesmo pescoço comprido, a mesma orelha, o mesmo sorriso mambembe... mas não me identificava comigo mesmo. Havia algo em minha cabeça. E eu logo percebi: cabelos.

Corri para o banheiro e lá estava a minha vasta cabeleira hirsuta, volumosa e rebelde. Bastante rebelde após uma noite de sono. Sorri ao rever os meus cabelos de volta. Sorri, ri, gargalhei. E gargalhei ainda mais ao ver o meu cachorro deitado no sofá da sala olhando para a minha cara sem entender.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Paixão ao som de Liverpool

Não sou o maior beatlemaníaco do mundo. Confesso que algumas vezes até tenho um pouco de dificuldade para distinguir o Ringo do George em algumas fotos mais antigas. Também não sei detalhes ou curiosidades do quarteto de Liverpool ou coisas do tipo.

Acontece que um dia desses, voltando para casa ouvindo Help! como há tempos não fazia, tive um pensamento bobo. Imaginei como seria um namoro (fictício, claro!) narrado praticamente inteiro com versos dos Beatles. É loucura imaginar e, mais ainda, tentar reproduzir.

Mas vejamos o que eu consigo. E qualquer coincidência com casos reais vividos por amigos ou semelhantes será pura coincidência musical.

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Tudo começou, claro, em uma balada. Após algumas músicas e muitas cervejas, o cara olhou para o lado e bateu seu olhar ao de uma garota. Well she looked at me and I, I could see that before too long I’d fall in love with her. Após uma ou outra troca de olhares, o cara tomou a iniciativa e foi atrás de sua paquera. Era o primeiro passo de tudo. Well, my heart went boom when I crossed that room and I held her hand in mine.

Segurar as mãos de uma garota, de fato, é algo fora do comum. Capaz de despertar um amor profundo em um homem caso a ‘química manual’, por assim dizer, bata. E com esse casal não foi diferente. And when I touch you I feel happy inside. Is such a feeling that, my love, I can’t hide. Não tardou, então, que a paixão instantânea se consolidasse. Close your eyes and I’ll kiss you.

Mas uma noite, por mais longa que possa durar, um momento chega ao fim. Antes de se despedirem, os dois enamorados trocaram juras se não de amor, pelo menos de paixão. Tomorrow I’ll miss you, remember I’ll always be true. Cada integrante do casal, contudo, foi obrigado a retornar à sua respectiva casa. Mas ambos estavam em êxtase e, apaixonados, foram cada um para um lado da cidade cantando para si mesmos: Ob-la-di, Ob-la-da, life goes on bra... la la how life goes on!

No dia seguinte, o rapaz acordou ainda mais entusiasmado ao abrir os olhos e se lembrar da garota que havia conquistado na noite anterior. E não conseguiu parar de pensar nela. Something in the way she knows that I don’t need no other lover. Something in her style that shows me I don’t want to leave her now, you know I believe and how!

Ligou para a nova amada e marcaram de se rever. Ela topou, mas um pouco insegura quanto ao que acontecia. Com sentido: havia conhecido o cara na balada, o que será que ele queria? Mas topou.

E após passar algumas horas com o seu novo amante, voltou para casa com os olhos marejados ao ler a carta escrita pelo cara e deixada dentro de sua bolsa. When I get older losing my hair, many years from now, will you still be sending me Valentine, birthday greetings, bottle of wine? Will you still need me, will you still feed me when I’m 64?

No encontro seguinte, a garota tinha apenas uma dúvida antes de se entregar de corpo e alma à nova paixão. Não tardou para que fosse esclarecida. You’re asking me will my love grow. I don’t know, I don’t know. 'Por quê? Amigos, antigas paixões?', questionava ela. 'Não', respondeu o rapaz. Of all these friends and lovers, there is no one compared with you. And these memories lose their meaning when I think of love as something new.

Na mesma noite, viveram a primeira noite de amor. E o cara, nas nuvens, não conseguiu dizer nada além da sua própria surpresa. You know you twist little girl, you know you twist so fine… Come on and twist a little closer now and let me know that you’re mine.

O rapaz, cego de paixão, acabou voltando sua vida em função da amante. Trabalho, amizades, demais tarefas... tudo passou para segundo plano. É claro que ele não se importava. And all I have to do is think of her.

Não muito tempo depois, marcaram de se reencontrar. Ele, certo de que passaria por ótimos momentos, mal se continha. Sitting in an English garden waiting for the sun. Looking for the girl with the sun in her eyes. Mas a mulher, estranhamente, já estava em outra. O cara não entendeu. Ela, então, tentou consolar sua antiga paixão. Nowhere man, don’t worry. Take your time, don’t hurry. Leave it all ‘till somebody else lend you a hand.

Em vão. O cara não entendeu e tentou contra-argumentar. Martha, my dear, you’ve always been my inspiration. Please, be good to me. Martha, my love, don’t forget me. Take a good look around you, take a good look around to see that you and me were meant to be for each other! Hold your head up, see what you’ve done! Também em vão. E tudo chegou ao fim.

O dia seguinte foi cortante como fel para o rapaz, que não conseguiu se livrar das memórias. Yesterday all my troubles seem so far away. Now it looks as though they’re here to stay. Suddenly I’m not half the man I used to be. Why she has to go I don’t know, she wouldn’t say. I said something wrong?. Tentou escrever uma carta para a sua antiga amada, mas parou assim que se sentiu como o Padre McKenzie: writing the words of a sermon that no one will hear.

Sua situação melhorou apenas quando voltou um pouco a si e reconheceu que não sairia desse mau momento sozinho. Recorreu a um amigo. Help! I need somebody, you know I need someone! Help! When I was younger, so much younger than today, never needed anybody’s help in any way. And now my life has changed oh, so many ways. I know I just need you like I’ve never done before.

E o amigo, antes esquecido, não se importou com o pedido de ajuda. Hey, dude, don’t make it bad: take a sad song and make it better. And any time you feel the pain, hey dude, refrain, don’t carry the world upon your shoulders.

Mas o rapaz ainda se sentia, no mínimo, debilitado. Now I’ve find I’ve changed my mind, I’ve opened up the doors. 'Calma', dizia o amigo. You’re waiting someone to perform with. And don’t you know that it’s just you? Hey, dude, you’ll do!

E ele conseguiu. Um mês depois, pegou-se dando conselhos e rindo da história para um outro amigo que acabara de passar por situação parecida. And all the broken hearted people living in the world agree that will be an answer: let it be.

terça-feira, 25 de março de 2008

Cor local

Era um início de tarde de sábado quando parou no semáforo para atravessar a Paulista do lado par para o ímpar. Estava um calor de matar, o céu estava azul e havia um sol forte e bastante iluminado sobre a cidade.

Ao parar diante da luz vermelha, brincou consigo mesmo: “Daqui a pouco o semáforo de pedestres vai abrir. A luz verde vai brilhar e vai permitir que você enfim inicie a sua vida. Este é o início de sua vida!”, pensou, com um sorriso no rosto e uma taquicardia no peito.

Então os carros pararam. O bonequinho vermelho ainda aparecia quando alguns dos pedestres atravessaram a avenida. Ele preferiu não avançar o sinal e só pisar na faixa quando as luzes indicassem. Alguns segundos depois as cores mudaram e ele respirou fundo. “Preparado? Não? Ah, mas você é um homem ou um rato? Tá bem, preparado. Vamos lá!”. Atravessou a rua.

Entrou em uma livraria. Desceu as escadas, passou pelo corredor com televisões de última geração, passeou por entre CDs e DVDs de vários estilos, subiu a escada rolante e logo se deparou com a mulher com quem iria se encontrar. Fingiu não tê-la visto e virou à esquerda. “Será que ela é mesmo a mulher da minha vida? Bom, vamos descobrir”.

Passeou por entre as estantes até que parou do lado dela. Cumprimentaram-se. Conversaram um bocado e resolveram ir almoçar. Voltaram a atravessar a rua, entraram em um shopping e pararam em um restaurante por quilo.

Encheram os pratos com carpaccios – a especialidade da casa –, salmão e uma torta de espinafre. Indicou uma mesa para a garota, que preferiu outra. Sentou-se à frente dela e começaram a comer enquanto conversavam.

Era só o início de um relacionamento intenso, que aqueceria seu coração.

Mas o tempo passou rápido para aquele cara que havia iniciado uma nova vida recentemente. E ele percebeu isso duas semanas depois do seu “primeiro dia de vida”.

...

Era um início de tarde de sábado e lá estava ele novamente parado no semáforo da Paulista para atravessar do lado par para o ímpar. Estava um frio de rachar, o céu estava cinza e caía uma garoa que agulhava a cidade.

Ao parar diante da luz vermelha, brincou consigo mesmo ao se lembrar do que acontecera tempo atrás. “Daqui a pouco o semáforo de pedestres vai abrir. A luz verde vai brilhar e vai permitir que você enfim constate que a sua vida mudou”, pensou, um aperto no peito.

Então os carros pararam. O bonequinho verde ainda não aparecia quando alguns dos pedestres atravessaram a avenida. Ele preferiu não avançar o sinal e só pisar na faixa quando as luzes indicassem. Alguns segundos depois as cores mudaram e ele respirou fundo. “Preparado? Ah... sim, preparado. Vamos lá”. Atravessou a rua.

Entrou em uma livraria. Desceu as escadas, passou pelo corredor com televisões de última geração, passeou por entre CDs e DVDs de vários estilos, subiu a escada rolante e não se deparou com a mulher com quem não iria se encontrar. Mas fingiu tê-la visto e virou à esquerda. “Será que ela era mesmo a mulher da minha vida? Eu acho que sim”.

Passeou por entre as estantes até que parou no mesmo lugar em que havia parado do lado dela. Um casal de namorados via o livro na estante. Resolveu ir almoçar. Voltou a atravessar a rua, entrou em um shopping e parou em um restaurante por quilo.

Não havia carpaccios aquele dia. Nem salmão. A torta de espinafre ainda estava lá, mas sem espinafre. Viu que a mesa onde havia sentado com a garota duas anteriormente estava ocupada por outro casal. Sentou-se na que tinha indicado a ela e começou a comer. Não balbuciou um som sequer.

Ele sabia que o relacionamento estava prestes a acabar. O coração gelado anunciava.

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Mal sabia ele que, no dia em que o fim fosse anunciado, o sol desapareceria do céu e daria lugar a uma chuva que caía forte e feria a estrada tortuosa.

domingo, 23 de março de 2008

Suspiros profundos

Um das coisas estranhas que aquele cara passou a fazer recentemente era a de, às vezes, parar na frente de um espelho de banheiro, apoiar os braços sobre a pia, inclinar o tronco para frente e suspirar, olhando dentro dos próprios olhos. Isso não aliviava suas tensões, mas mesmo assim continuou com o hábito.

Ele achava estar meio perturbado. Vinha mudando de humor constantemente, indo da felicidade extrema à depressão profunda e retornando em menos de duas horas e não entendia bem o porquê. Ou não queria entender.

Acordou em um dia de verão e não viu o céu azul e nem o sol brilhar, como havia se tornado costume nas últimas semanas. Também não ouviu os passarinhos cantando e nem nada. Não sentiu um arrepio gelado em pleno calor. Sentiu algo inflamado dentro de si em pleno dia frio. Por certo andava perturbado.

Foi quando parou em frente ao espelho do banheiro, apoiou os braços sobre a pia, inclinou o tronco para frente e suspirou profundamente, olhando dentro dos próprios olhos. E percebeu que havia se enganado: não estava preocupado, mas apenas inseguro. Com medo. Estava tremendo de medo.

A razão de tal temor não tardou a aparecer. Andando pela sala inóspita, puxou o lábio inferior em um gesto pensativo e sentiu o que lhe atordoava. Estava prestes a perder a mulher amada e não sabia como lidar caso o fim se concretizasse.

Não, não tinha a menor noção do que iria fazer diante da situação constrangedora e iminente. E, embora nada ainda tivesse sido sacramentado, já sentia falta de todos os pequenos detalhes que haviam aquecido – e superaquecido – seu coração.

Sentia falta do cheiro doce que sentia quando abraçava a mulher. Sentia falta de ouvir a voz ainda mais doce da mulher quando conversavam ao pé do ouvido. Sentia falta de segurar a mão pequena, macia e delicada da mulher. Sentia falta de sentir a pele do rosto da mulher na palma de sua mão. Sentia falta de encostar o nariz ao nariz da mulher e olhar no fundo dos olhos dela.

Sentia falta de sorrir ao encostar o nariz ao nariz da mulher e vê-la sorrir de volta. Sentia falta de olhar a boca pequena e delicada da mulher. Sentia falta de beijar a boca pequena e delicada da mulher. Sentia falta das mordidas que a mulher dava no lado esquerdo de seu lábio enquanto se beijavam. Sentia falta de ter o lado esquerdo do lábio inferior inchado pelos beijos da mulher.

Sentia falta de tudo isso e muito mais. Ele sentia falta da mulher. E não saberia como conseguiria viver daquele dia em diante se não visse mais aquele sorriso que durante rápidos momentos iluminou o mundo.

Compreendido por si mesmo, parou em frente ao espelho do banheiro, apoiou os braços sobre a pia, inclinou o tronco para frente e suspirou profundamente, olhando dentro dos próprios olhos. E viu uma lágrima solitária cair do seu olho direito. Da mesma forma que quando estava com a mulher.

sábado, 22 de março de 2008

Sobre a minha primeira entrevista na televisão (com link)

Antes, veja o que já foi postado sobre o caso clicando aqui e aqui.

Para os poucos (pouquíssimos) que viram poderem rever.
Para os muitos (muitíssimos) que não viram terem a chance de ver pela primeira vez.
...
E para que eu possa massagear meu ego em algum dia ruim.


(Ok, eu sei que a imagem não está das melhores e o áudio está bem baixo. Mas é o máximo que eu consegui)

sexta-feira, 21 de março de 2008

Au revoir na favela

São José dos Campos (SP) - Quando ouvia falar na favela de Heliópolis, imaginava a maior bocada do mundo. Aquele tipo de lugar aonde se vai e, com muita sorte, não se volta com um pipoco no corpo.

A minha ‘primeira vez’ na Heliópolis foi em 2006, quando fui a São Caetano para passar tardes inesquecíveis com uma amiga já citada aqui anteriormente. E não foi nada punk, apesar de o meu amigo, dirigindo, me pediu para fechar o vidro do carro. “Sacomé, né?”. “Uhum, sei”.

Até que em um dia desses, num domingo qualquer, acabei tendo que voltar à maior favela do Estado de São Paulo. E, ao descer do microônibus reservado à imprensa que cobriria a passagem do astro francês Zinedine Zidane, acabei me surpreendendo. “Nossa, as casas aqui são bonitas, bem feitas. E as lojinhas aqui dessa rua, então... pô, bonito!”, pensei comigo mesmo.

Fui seguindo o caminho até a quadra onde o Zizou daria o ar da graça e entrei em uma ladeirazinha estreita, com casas menos abastadas e muita gente nas portas de seus lares. Ouviam música alta, conversavam... tipo o que se faz no interior, eu acho.

Com a cabeça baixa e as lentes dos óculos ligeiramente embaçadas, tomei um susto quando, repentinamente, um garoto de não mais do que oito anos brotou em minha frente assim como um gato preto sai da moita em uma noite qualquer. Então, olhei para o lado e vi uma outra ladeira, com casas precárias, mas com pessoas nas portas. Gente cansada, acabada.

Enfim. Claro que não fiquei pensando na desigualdade social enquanto estava fazendo a cobertura da vinda do Zidane, mas era curioso ver inúmeras pessoas que sobrevivem de uma forma muito abaixo do mambembe em êxtase por ver um... um jogador de futebol que, certamente, ganha em um dia o dinheiro dez vezes maior do que um morador da favela conseguirá em toda a sua vida.

Mas o carequinha francês, embora tenha evidenciado a discrepância entre o primeiro mundo e o submundo de uma favela paulistana, teve uma importância incrível para aquela comunidade. Embora houvesse uma batalha por cada milímetro mais próximo ao Zidane, mostrou a união de todos. E essa unidade exalava um certo otimismo, explicitava um sonho. Era bacana de se ver.

Mas é claro que não pude deixar de notar um detalhe. Enquanto, do lado de dentro da quadra poliesportiva da Heliópolis o apresentador do evento arriscava uns “Zidane, merci beaucoup”, “Zizou, si vous plais” e um “Bienvenue vers lê Brésil, monsieur Zinedine” em um francês aparentemente decorado, do lado de fora um carro clamava por limpeza: “Lavemi por favor”.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Sobre a minha primeira entrevista na televisão

Já relatei aqui, no início deste ano, como é desagradável ser entrevistado. Eu, estagiário que entrevista pessoas por aí, acabei me acostumando mais por estar atrás das câmeras perguntando, e não na frente dela, respondendo. Mas após ser entrevistado próximo ao Ginásio do Ibirapuera em janeiro, achei que minha cota na frente das câmeras tinha acabado. Nem tanto.

Era uma tarde de segunda-feira na redação e eu estava empolgado por motivos óbvios: tinha visto o Zidane jogar e ainda tinha-o entrevistado no dia anterior, o Palmeiras tinha vencido o São Paulo por 4 a 1, estava apenas iniciando uma semana curta que terminaria em um feriado gigante e com uma viagem... Enfim, tinha razões de sobra.

E foi nesse estágio de empolgação que o Shrek me perguntou o meu ramal. Estranho alguém me ligar na redação, mas sempre há alguma surpresa: assessores de imprensa, colegas desesperados... certa vez, os técnicos de Thiago Pereira e da seleção venezuelana masculina de vôlei me ligaram no mesmo dia. Achei que, depois disso, minha maré de sorte workaholic tinha acabado. Errei.

Falei ‘5956’ para o Shrek e meu telefone tocou. Atendi com um ‘Gazeta?’ de sempre e tive uma surpresa ao ouvir uma voz feminina do outro lado. “Oi, Felipe? Prazer, meu nome é Marcela e eu sou produtora do BandSports, tudo bem?”. “Sim, Marcela, tudo bom...”. “Então, Felipe, você acompanhou o Zidane ontem, participou da coletiva, foi ao jogo, certo?”. “Sim, sim”.

(Neste momento, achei que eles precisariam apenas que eu confirmasse alguma informação ou passasse alguma aspa do Zizou que eles não tinham entendido. Errei de novo).

“Ah, legal”, disse a Marcela. “É que o Erick Beting gostaria de te entrevistar hoje no programa dele, o Parabólica, às 19 horas. É coisa rápida, você entra por telefone e fala cinco minutinhos, pode ser?”. Lembrei que meu grupo de telejornalismo na faculdade tinha marcado para fazer aqueles Fala Povo na Paulista justamente nesse horário. Com culpa, respondi “Sim, sem problemas”. E passei a me preparar para a minha primeira entrevista ao vivo na televisão. Empolgação!

Rapidamente, enviei um e-mail quase que ensandecido para a Fla avisando a novidade. Instantes depois falei a novidade para o Raul e para o Mané. Assim que o Pré-olímpico de boxe deu uma folga na ESPN Brasil, liguei para a minha mãe e também a avisei do que aconteceria. O único problema era que, como o BandSports só é sintonizado na TVA, todo mundo teve que se aglomerar na frente dos computadores, na TV UOL.

Então o tempo passou até que o relógio do meu computador marcou 19 horas e minha mão começou a gelar. Levantei, enchi a minha garrafinha d’água e retornei à minha cadeira. 19h15 e nada. Virei para trás e perguntei à Martinha e à Carol Canossa, que já haviam sido entrevistadas no BandSports, se a demora era normal ou se corria o risco de terem derrubado a pauta no programa e nem terem me avisado. Sim, eu estava nervoso e ansioso. E com um medo danado de gaguejar ou falar alguma groselha na televisão.

Foi quando o Raul perguntou meu ramal, às 19h18. Respondi 5956, falei rapidamente com a Marcela e ela me colocou no ar. Antes de ser anunciado pelo Erick Beting ("Estamos na linha com Felipe Held, repórter da Gazeta Esportiva.com.br"), olhei para trás e vi a redação inteira aglomerada na frente do computador da Carol para ver a entrevista. Responsabilidade!

No ar tudo correu muito bem. Não houve perguntas bizarras como aconteceu com a Carol, que teria que falar sobre judô com a Bárbara Gancia e foi perguntada sobre Mianmar (ninguém mandou menosprezar a minha notícia de geopolítica!). Tudo correu bem, eu não gaguejei e nem falei tantas besteiras. Até fiz piadinha. Claro, deixei a redação com um sorriso de orelha a orelha.

E, para fechar o dia, ainda dei autógrafo para o Mané. Que dia!

terça-feira, 18 de março de 2008

Que lo cumpla feliz

São poucas, pouquíssimas as pessoas que sabem, mas 18 de março é o dia em que Felipe Held completa mais um ano de vida, seu 25º.

Felipe Held nasceu em uma data importante para o mundo: foi em 18 de março de 2003 que os Estados Unidos iniciaram o bombardeio ao Iraque. Um pouco antes, em 1965, o russo Aleksei Leonov se torna o primeiro cosmonauta a caminhar no espaço. Já em 1944, o Vesúvio entrou em erupção na Itália pela sexta vez no século 20 (embora a que ocorreria em 1979 seria muito mais fatal, tornando-se a mais conhecida da história do vulcão).

O tal do Felipe Held ainda pode se gabar por ter nascido no mesmo dia em que foi declarada a Comuna de Paris, em 1871. Muitos séculos antes, em 37 d.C, o senado de Roma havia proclamado seu terceiro imperador: o jovem Gaius Julius Caesar Augustus Germanicus, de apenas 24 anos, que entrou para a história como o Calígula.

Mas voltemos ao Felipe Held. Por conta do sobrenome exótico, de origem germânica, ele certamente passou por apuros nas aulinhas de inglês. Nascido em um país latino em que o idioma bretão é indispensável no currículo escolar, teve que agüentar a gozação dos colegas de sala que acreditavam que seu sobrenome era apenas o particípio do verbo hold.

O tal do Felipe Held, no entanto, conseguiu superar as piadas sem graça sobre seu sobrenome. Chegou a ter uma carreira promissora – se digitado seu nome no Google, certamente alguns resultados aparecerão no resultado da busca.

Fã de esportes, Felipe Held não teve tanto sucesso no que escolheu para a sua carreira. Apesar do sonho de criança, não chegou a ser o melhor do mundo. Há quem duvide até mesmo de que ele tenha se esforçado para isso, dada a sua personalidade fraca e maleável.

Mas não é por isso que hoje os poucos que lembraram certamente deixarão de dar a Felipe Held, o tenista chileno que não vingou e abandonou a carreira esportiva antes mesmo de entrar no circuito profissional, os mais sinceros parabéns.

Feeling: Sinto que fui xingado por todos os outros que acreditaram que hoje, de fato, era o aniversário deste Felipe Held que vos escreve...

domingo, 16 de março de 2008

Não vi Valdívia, mas vi Zidane

Era dia 12 de julho de 1998 quando o dia, um domingo insosso, estava frio, chuvoso e cinzento. Naquela data, à tarde, parei em frente à televisão da sala com o resto da minha família e torci. Era final da Copa do Mundo.

Mas a minha vibração demorou menos que 45 minutos: bastou um cara antes desconhecido marcar dois gols de cabeça e acabar com os sonhos de toda uma nação sul-americana.

Quase dez anos se passaram até que o cinza voltou a ser a tônica de um domingo na capital paulista. E eu me via em uma sala, sem o resto da família mas com um monte de colegas desconhecidos de imprensa, com um microfone na mão.

“Zidane... opa, eu, aqui em cima. Isso. Zidane, eu queria saber o que você espera da Eurocopa este ano, se já aponta uma ou mais seleções favoritas... e também se o fato de que o Trezeguet pode ficar de fora por causa dos problemas com o Domenech deixa a França mais fraca?”.
Foto: Marcelo Ferrelli/GazetaPress
E foi assim, fiéis (dois) leitores, que eu percebi o que tinha acabado de acontecer. Sim, eu tinha entrevistado Zinedine Zidane, o craque da França e carrasco do Brasil nas Copas de 98 e 2006. O cara considerado o melhor jogador do mundo nos últimos tempos. O último gênio do futebol. Ele mesmo.

Reconheço que a pergunta feita por mim não era lá essas coisas. Acontece que cada jornalista tinha direito a bolar três perguntas, das quais uma seria escolhida. E as duas perguntas criativas boladas pelo Mané não passaram no crivo da assessoria de imprensa do Zidane.

Mas enfim. Meu primeiro contato com o Zidane foi, ironicamente, em uma favela. Na Heliópolis, que tem 1 milhão de metros quadrados e 125 mil habitantes (nota da redação: dados coletados em um trabalho acadêmico não feito em 2007). E ele, mais ironicamente ainda, vestia uma jaqueta verde e amarela. Deu até raiva, não fosse aquela sensação de ver de pertinho alguém que eu só via pela TV a cabo e no videogame.

Só que não fui o único que teve essa raiva aliviada pela presença do carequinha. Na quadra de futsal do Clube Paineiras (que ganhou a minha simpatia ao ter uma sala de imprensa muito boa e por ter várias quadras de tênis muito bem conservadas), foi até certo ponto chocante ver um grito uníssono quando o Zidane apareceu. Não havia um grito de desaprovação. Todos estavam vislumbrados. E eu também.

Até que a bola começou a rolar. Eu, colado na lateral da quadra, usava a minha credencial de imprensa como desculpa para ficar tão pertinho de craques como Djalminha e Rivelino. Até que chegou um cara mal humorado da arquibancada e pediu para eu sentar no chão – o que não me deixaria ver o jogo. Segue o diálogo.

Foto: Reprodução
“Cara, não dá, tô trabalhando (eu estava mesmo)!”. “Ah, mas eu não consigo ver assim”. “E aí quem não vai ver sou eu. E eu tô trabalhando!”. “E você não pode abaixar um pouco?”. “Não. Eu já sou baixo, não tá vendo?”. “Vai, senta que eu tô mandando”. “Hahahaha! Mandando? Hahahaha!”. “OK, não vai sentar?”. “Nem a pau!”. “Então vou contar pro seu supervisor”. E eu comecei a rir. Imaginei um cara ligando em pleno domingo pro Raul, editor de plantão, e dizendo “Olha, o seu repórter não quer sentar no chão”. Seria bizarro.

Polêmicas à parte, vários molequinhos de dez anos, cúmplices por estarem de pé ao meu lado, me defenderam. E começamos a bater um papo. Eles perguntaram meu nome, perguntaram se eu escrevia no jornal, disseram que iam ler a matéria e um deles até se comprometeu a mandar um e-mail pro Fale Conosco dizendo que eu era gente boa e merecia um aumento. Engraçado.

Então o jogo de futsal acabou, o Zidane saiu da quadra e eu voltei para a sala de imprensa. Foi só então que lembrei do clássico entre Palmeiras e São Paulo e passei a acompanhar o resultado pelo ao vivo do site. Enfim (por solidariedade ao Fabio e mantendo o combinado de pegar leve no blog depois do duelo, fica restrito à matéria do Fini o meu comentário do jogo).

Bem... não vi o clássico do final de semana. Trabalhei como uma mula, fui abandonado no meio da favela (as vans reservadas aos jornalistas não me esperaram e, por sorte, eu consegui voltar em um microônibus da Adidas) e não comi nada o dia todo. Mas vou poder um dia contar aos meus filhos que entrevistei o Zidane e o vi jogar. Ao vivo, a cores e a meio palmo de mim. E vou poder até mostrar a minha foto com o craque para eles!

Foto: EFE
OK, eu sei que esta é a minha primeira foto pessoal neste blog, mas... para quem caiu aqui de pára-quedas, eu sou a pessoa em destaque. Isso, ali em cima, perto do travessão. Ou pelo menos aquela é a minha barba.

sábado, 15 de março de 2008

Teste surpresa

Perder documentos é fácil, mas culmina em dias de uma burocracia do tamanho de dois bondes juntos nos dias seguintes.

Depois de ter a minha carteira cruelmente, terrivelmente, maquiavelicamente e exageradamente furtada na última quarta-feira, fiz o Boletim Eletrônico de Ocorrência (BEO), sem ter que sair de casa, e tive o pedido negado.

A policial em questão pediu para que eu entrasse em contato para prestar mais informações sobre o acontecimento (se ela tivesse clicado aqui saberia tudo o que era necessário para o preenchimento do boletim). Mas como não sou de divulgar este humilde blog por aí, preferi retornar a ligação. E expliquei tudo tintim por tintim.

Bocudo que sou, acabei explicando ainda mais. “Ah, mais uma coisa, senhora policial. Roubaram também o meu RG, mas era a primeira via, que eu tinha tirado há uns dez anos. Fiz uma nova este ano, mas ainda não retirei no Poupatempo”. Ela anotou as informações e logo em seguida disse que iria aprovar o BEO.

Ao chegar no trabalho, no entanto, recebo uma cópia do boletim no meu e-mail pessoal e qual não foi a minha surpresa ao ver na última linha o esclarecimento: “E consta também que o RG expedido em 11 de fevereiro de 2008 fica bloqueado irreversivelmente”.

Soltei um riso meio desesperado ao ler isso. Justamente o RG que ainda nem tinha vindo oficialmente ao mundo estava bloqueado. O Mané, então, rapidamente se prontificou em comentar um “Que fase, hein?”. Que fase!

Mas toda crise que se preza tem ascensão, apogeu e queda. E hoje, quando a fase conturbada já se encaminhava para uma dissolução, essa história toda acabou me rendeu um acontecimento engraçadinho nesta noite fria de sábado.

Ao me lembrar de que tinha esquecido de citar o cartão de senhas de acesso do banco no BEO, fui intimado pela minha mãe a ligar o mais rápido possível do Atendimento ao Cliente do meu banco e bloquear o cartão.

Depois de dois atendentes brincarem de pingue-pongue comigo e me transferirem algumas vezes, fui atendido pela Daniela, uma moça bem simpática e prestativa. Para ter a certeza de que estava falando com o titular da conta, fez um teste: “Você tem todos os seus documentos em mãos? Vou fazer algumas perguntas pra poder confirmar o seu cadastro, vamos lá?”.

Menti ao dizer que tinha os documentos em mãos e engoli seco. “Talvez ela vá perguntar o número do meu CPF e ultimamente eu tenho esquecido. Bom, vamos lá!”, arrisquei. Acabei percebendo que seria sacanagem usar a consulta no meu cartão assim que o teste feito pela atendente Daniela começou.

“Vamos lá, Felipe. Em que dia você nasceu? Quantos anos você tem atualmente? Qual o nome da sua mãe? E do seu pai?”. E deve ter sido com um sorriso no rosto orgulho que ela disse que eu tinha passado no teste com louvor e média 10.

Orgulho! Agora só faltam mais dez matérias na faculdade pra encerrar o ano...

sexta-feira, 14 de março de 2008

Somente emergência

De volta a um bar em que eu chamo o dono pelo nome, me lembrei de um dia da minha vida, algum tempo atrás. Um dia em que eu ainda podia ouvir A day in the life indo para o trabalho. Um dia em que eu não estava no trabalho, mas no bar com alguns amigos.

Depois de deixar o copo sobre a mesa, fui abrir a contagem no banheiro. E então, ao abrir a porta do toalete masculino, me deparo com um cara olhando fixamente para o celular. Ao ouvir a porta abrindo, levantou a cabeça e, já meio alto, comentou comigo: “Tá sem sinal. Olha só, que merda!”

Levantei as sobrancelhas, concordei com um “ah, é foda” e tomei meu rumo. Acontece que eu também lembrei que precisava usar o celular o mais rápido possível. Ao sacar o meu do bolso, olhei para a tela e vi a mensagem: “Somente emergência”.

“Bom”, pensei comigo, “é de extrema necessidade o que eu preciso falar no telefone. Talvez funcione”. Cacei o número desejado na agenda, apertei a tecla verde e esperei o chamado. Não deu muito tempo, tive a confirmação de ligação perdida. Não havia sinal. No, no donut for me.

Desci as escadas do bar inconformado. Sentei à mesa e comentei com os amigos. “Pô, eu precisava fazer uma ligação de emergência e meu celular não deixou!”. Perguntaram se eu tinha que ligar para a polícia, para os bombeiros, para o Resgate. Respondi que não e expliquei a causa.

“Ah, vaaaai!”, comentaram em sintonia e entornaram mais um gole. Tentei também. Mas o meu desceu quadrado.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Nada é perfeito (ipod in memoriam)

Embora não seja a pessoa mais otimista do mundo, não nutria nenhum sinal de pessimismo em relação às perspectivas a respeito da quarta-feira, 12 de março. Muito pelo contrário, diga-se. Em um raro período de excitação vivido ultimamente, até cheguei a comentar com a Lucy que o dia seria perfeito.

Por que seria perfeito? Bom... ainda que o fanatismo pelo meu time de futebol não seja mais o mesmo de uns nove anos atrás, ontem teria jogo do Palmeiras no Palestra Itália e ambos iríamos. Isso tudo já valia por si só.

E a expectativa de ir ao Parque Antártica nem me deixou abalado logo pela manhã, quando eu descobri que não teria como enviar alguns documentos necessários para a minha tão sonhada viagem de férias e fui obrigado a rever alguns planos. Enfim.

As coisas melhoraram bastante quando eu saí do trabalho e fui informado de que não haveria aula na faculdade. Muito embora eu nem planejasse assistir às duas aulas do dia, o fato de que não receberia faltas para ir ao jogo inflou meu otimismo. Shrek, um dos estagiários que ralam absurdamente muito, e eu, então, fomos juntos ao Palestra até a metade do caminho, quando ele foi se encontrar com o pai e eu, com a Lucy.

“Nossa, são nove da noite e eu estou andando aqui, sozinho, nessa rua escura pra caramba. Algum tempo atrás eu teria medo, mas não hoje”, foi o que eu pensei enquanto me preparava para entrar na Turiassu. Mas parei de me preocupar quando revi na fila da bilheteria o Chitão, amigo dos tempos de colégio e grande companheiro de Palestra. Foram alguns minutos para trocar risadas, perguntas de praxe... momentos bacanas.

Então entramos no estádio sem problemas, nos encontramos com a família do Shrek e o jogo começou. Apesar de a Ponte Preta ter marcado 1 a 0, não desanimamos. Também não desanimamos quando a chuva caiu, apertou e nos castigou. Até porque o Palmeiras virou e ganhou por 2 a 1. Perfeito, mais divertido que uma goleada.

Na saída, a chuva, que já era forte, ficou ainda maior. Fiquei prestando atenção nas poças de água na Turiassu enquanto voltava com a Lucy, que em certo momento me puxou um pouco preocupada e aconselhou “vem pra cá”. Olhei para trás e vi um cara com a mão ligeiramente esticada.

Assim que paramos na Sumaré, virei a mochila para pegar o celular da Lucy e o bolso estava aberto pela metade. Não encontrei o meu ipod, a minha carteira e, pior, nem o celular dela. Fui roubado pela primeira vez em 20 anos. Assim que me dei conta, uma enxurrada passou com tudo pelos meus pés. “Tava tão bom hoje, Lucy, mas sempre tem algo pra estragar e não deixar as coisas perfeitas”, reclamei, quase que infantilmente.

A “sorte” foi não ter perdido também o meu celular. Consegui passar meu paradeiro ao Shrek e voltar de carona para casa. Além disso, ainda vi que ficaram comigo o bilhete único, a chave de casa, o cartão do banco, o VR e o crachá da Gazeta. Menos pior.

Então acordei hoje cedinho, terminei o relatório da faculdade sobre Ciência Política e fui ligar para o Bronzatto para avisar que a minha parte estava terminada. Meu celular, que se molhara um pouquinho, ficou temperamental. Disparou a tecla 4 e o botão verdinho só trabalha quando quer.

Além disso, perdi todas as anotações de aula feitas nas últimas seis semanas (eram duas páginas de monobloco), a apostila de Ciência Política está parecendo uma sopa de letrinhas e a Odisséia herdada do Mané ficou em estado ainda mais deplorável. Repetindo o próprio Mané, que por sua vez repetiu a Carol Canossa, não exite alomço grátis.

Ah, que maravilha! Mamãe vai adorar quando ler isso....

terça-feira, 11 de março de 2008

Estrelato de 50 minutos do eucalipto jacareiense

Toda árvore tem uma história e, também, faz parte da história de incontáveis seres. Ela já serviu de abrigo para vários tipos de animaizinhos, de alimento para muitos outros... pode ter sido o local do primeiro beijo de muitos casais de namorados, etc. etc. etc.

Toda árvore guarda consigo um espírito vencedor por ter sobrevivido a períodos de seca, a pragas, ao desenvolvimento urbano do homem, à poluição... e a derrubada de uma árvore representa uma vitória covarde e cruel do ser humano.

Mas é claro que eu não pensei nisso recentemente. Sentado na primeira poltrona de um ônibus de viagem, vi crescendo à minha frente um congestionamento enorme na Via Dutra em pleno fim de tarde de sábado.

Uma placa sinalizava meu paradeiro:
Jacareí – 2 km
San José, CA – 18 km
Rio de Janeiro – 339 km

Então o ônibus abriu a porta e todos os passageiros desceram para esticar a perna. Todos sacaram seus celulares e ligaram para algum conhecido: “Olha, vou me atrasar. A estrada tá parada, parece que eu vi um carro virado e vai demorar umas duas horas pra liberar”. Fiz o mesmo, mas sem inventar tanta história.

No mesmo instante, um cara desceu de um trator e passou ao meu lado. Meu espírito quase jornalístico me fez abordá-lo e perguntar o que de fato tava rolando. “Ah, não é nada de mais, não. Acontece que vão derrubar um eucalipto velho ali na frente e aí interditaram a estrada pra não cair galho em cima dos carros. Daqui uns 40 minutos liberam o tráfego de novo”. Mais uma pergunta: onde eu estou? “Ah, aqui já é Jacareí”.

Sem muita alternativa, voltei ao ônibus, peguei a Odisséia herdada do Mané, sentei na grama e continuei lendo as aventuras e desventuras de Ulisses, que na verdade se chama Odisseu, em vários lugares inventados por gregos chapados. E fiquei nisso durante uns 30 minutos.

Não foi raro ouvir reclamações ao meu lado de pessoas execrando a prefeitura jacareiense por interditar o trânsito no sábado à tarde para cortar uma árvore. Claro, também dei uns pitacos sobre a inteligência de parar uma estrada à tarde, e não de madrugada, quando o tráfego é menor (agora, já em São Paulo novamente, imagino que possa ser um pouco perigoso. Enfim).

Então o tráfego foi liberado 50 minutos depois de o ônibus de viagem saído de São Paulo ligar os motores, acelerar e seguir caminho a San José, Califórnia. Ao passar pelo famigerado eucalipto, ele estava lá, em pé, não havia sido derrubado.

O eucalipto jacareiense era apenas uma árvore que deixou de passar desapercebida, ao contrário das outras muitas mil com que me deparei ao longo da viagem. Era uma árvore que sobreviveu à brutalidade humana e, de quebra, ainda entrou para a história da minha oitava viagem.

domingo, 9 de março de 2008

Sabedoria materna

Parte 1:
Sábado de manhã. Eu, no banco do passageiro, rabiscava algumas palavras no papel e tentava elaborar uma lista de coisas para colocar na mochila antes de viajar. Mamãe ao meu lado.

“Camisetas, camisa do Palmeiras, bermuda, cueca, meia, documento, dinheiro, Odisséia, apostila, escova de dente, pasta, xampu, desodorante, sabonete, toalha de banho, carregador de celular...”. Estava completa.

Então minha mãe sentenciou: “Você vai esquecer alguma coisa, quer ver?”. Ah, hoje não. Ela tinha que errar algum dia, e nada melhor do que naquele sábado.

Parte 2:
Cheguei em casa, coloquei a lista em cima da cama e, enquanto socava tudo dentro da mochila o mais rápido possível, riscava o correspondente na listinha. Terminado, abarrotei tudo um pouco mais pra fechar a mochila e pronto.

Parte 3:
Antes de voltar ao carro, até lembrei de passar na guarita e pegar o meu jornal do dia. Dia de crônica do Marcelo Rubens Paiva no Caderno 2. Dia em que o jornal vale a pena. Então joguei a mochila no banco de trás e sentei no banco do passageiro, antes de mamãe começar um interrogatório.

“Pegou camiseta?”. “sim”. “Bermuda?”. “Uhum”. “Meia?”. “Três pares”. “Cueca?”. “Yep”. “Documento, dinheiro, xampu, sabonete, carregador de celular?”. “Confere, confere, confere...”.

Parte 4:
Mamãe insiste no interrogatório antes de colocar o carro na garagem do prédio. “Tá levando camiseta?”. “Tô”. “Bermuda?”. “Também. “Meia e cueca você não esqueceu, né?”. “Não”. “E o carregador de celular?”. “Tá aqui”. “E xampu, sabonete, toalha de banho...?”. “Tudo nas profundezas da mochila, mãe”.

Parte 5:
Depois do almoço. Novamente no carro, agora a caminho do metrô, que por sua vez me deixaria na rodoviária, com mamãe no volante e no comando da entrevista.

“Não esqueceu carregador de celular?”. “Não, mãe (note como as respostas soam quase entendiadas)”. “E bermuda, meia, cueca?”. “Peguei...”. “Blusão?”. “Tem lá”. “A toalha de banho tá na mochila?”. “Sim, junto com o barbeador”. “E escova de dente, pegou?”.

Tapa na testa: “Puuuuuuuuta merda, não”.

E a sabedoria materna me venceu mais uma vez.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Escapadas (Dia livre, o retorno)

Quando era pequeno – e quanto digo isso me refiro aos meus oito ou nove anos –, não tinha a menor idéia de que dali uns dez anos estaria na faculdade e, de quebra, trabalhando. É óbvio, jamais poderia imaginar que decidiria fazer jornalismo e nem que seria estagiário de um veículo de comunicação cujo slogan é “o melhor site de esportes do Brasil”. Naquela época, eu nem sabia o que era um site.

Acontece que, na minha visão, trabalhar queria dizer vestir calça, sapato, camisa, gravata e paletó, pegar o carro e fazer alguma coisa até umas 17 horas. De segunda a sexta e amem.

Isso que eu faço hoje de acordar quase ao meio-dia, bater cartão às 14 e depois às 19, de tênis, camiseta e calça jeans, não seria trabalho nem aqui e nem na China. E quanto a trabalhar no final de semana, então? Folgar em um dia da semana? Peraí, tem certeza de que estamos falando de trabalho?

Pois bem. Contra quase tudo e contra quase todos (até mesmo contra mim mesmo), minha vida chegou a esse ponto. E hoje eu sou alguém que não usa roupa social e folga em um dia útil a cada duas semanas. Hoje, inclusive.

Arranjar o que fazer em um dia de folga não é complicado. Poderia, por exemplo, desfalecer sobre a minha cama durante muito, muito tempo e repor todas as energias. Era possível também ir ao Ibirapuera, ao clube, ao cinema... ou então ir para biblioteca da faculdade e ler todos os 20 mil textos “obrigatórios” ao curso. Melhor não. Até mesmo o escadão parece ser idéia melhor.

O que eu decidi fazer? Ora, simples: botei o pé na estrada. Isso mesmo, viajei – e não foi na maionese (piada ruim detectada). Quinta-feira, rodoviária do Tietê, 9h07, guichê de uma empresa. “Qual é o próximo ônibus pra tal lugar?”. “9h15”. “Tá, pode ser”. “17 reais. Plataforma 50, o senhor tem dez minutos”.

Enquanto o mundo corria, eu descia as escadas para a plataforma 50 dançando Beatles. Enquanto o mundo ia para o trabalho, eu ia viajar por aí só com uma mochila nas costas.

Ao entrar no ônibus, relembrei aqueles passeios escolares ao museu ou coisa do tipo. Procurei, então, um assento vazio no fundo, abri as ventoinhas de ar condicionado... os motores foram ligados, as portas foram fechadas... E agora (nota da redação: este texto foi escrito dentro do ônibus) eu olho para o lado e só vejo mato, mato, mato, carro, mato, vaca, cavalo, mato, uma fábrica aqui e outra ali. E acredito que os meus seis companheiros de ônibus vêem a mesma coisa. Mas sem a minha trilha sonora de Shout out Louds.

Quer saber? Posso trabalhar comom um louco – especialmente aos finais de semana – e não ter lá muitas pretensões salariais no futuro. Mas não trabalho de terno e gravata, tenho folgas durante a semana e, agora, estou viajando com a sensação de estar cabulando aula, mas sem o medo de ser flagrado e ter que dar satisfações.

Ainda bem que eu me enganei dez anos atrás!

quarta-feira, 5 de março de 2008

Ponto de encontros casuais

O fato de morar em uma cidade grande não dá a garantia de que você sempre terá alguma coisa para fazer. E foi justamente nesse contexto em que eu me encontrei hoje, quando bati o cartão do trabalho às 17 horas e teria que esperar até às 19 para entrar na aula.

Entre as duas opções que me restavam (ficar na Paulista ou voltar para casa e retornar logo em seguida), optei pela primeira, ajudado por um filme em cartaz no cinema. Mas como a sessão teria início apenas às 17h30, seriam 30 minutinhos de tédio.

Foi quando eu resolvi matar o tempo sentado no escadão da Gazeta com o ipod no colo e os fones (novos!) nos ouvidos. Mas o mais estranho é que, não fosse o bilhete do cinema no bolso, eu certamente teria o que fazer até as 19 horas.

Assim que me acomodei em um dos milhões (?) de degraus, vi lá embaixo uma antiga conhecida, amiga de uma antiga amiga minha, andando meio despreocupada. Poderia ser uma boa chance de rolar um “e aí, como você tá, que anda fazendo, tem notícias daquele cara e lembra daquele dia engraçado?”. Mas a música no meu ouvido estava mais interessante.

Menos de três minutos depois, vi passar um colega do meu condomínio. Mais tarde, quem apareceu foi um dos meus colegas de trabalho, enquanto instantes em seguida foi a vez de uma colega de faculdade.

A primeira pessoa que veio falar comigo, no entanto, não me conhecia. “Opa, cara, onde fica o Mercado Pirituba?”. Ainda me readaptando ao som ambiente, pedi para repetir. “Onde eu encontro o Mercado Pirituba?”. Pensei, pensei... “Mercado, tem certeza? Pìrituba é longe pra caralho”, salientei. “Sim, é... eu tenho que ir lá pra Ponte dos Remédios e tenho que pegar esse ônibus”, explicou.

Lembrei. O Bruno Neguinho mora nesse fim de mundo. Bastou puxar pela memória e... “Cara, tem o Terminal Pirituba, não seria isso?”. Uma luz brotou na cara dele. “Sim, é, é Terminal Pirituba! Onde eu pego?”. “Olha, é aquele ali que acabou de fechar as portas no ponto de ônibus”. O cara agradeceu e saiu correndo. Em vão.

Nos minutos seguintes sentado no escadão, vi vários conhecidos passarem atordoados, compromissados, descompromissados e relaxados. Claro, não vi quem eu realmente queria ver. Até que as 17h30 chegaram e eu tive que partir para o cinema. Mas que o escadão é um programa e tanto contra o tédio, disso eu passei a não ter mais dúvidas.

terça-feira, 4 de março de 2008

Da primeira vez não se esquece (apenas de algumas partes)

Meu primeiro jogo em um estádio aconteceu em setembro de 1998, com um 1 a 0 magrinho do Palmeiras sobre o Internacional no Palestra Itália. Desde então, passei a freqüentar o Parque Antártica com o meu pai apenas em jogos de uma torcida. Clássico era perigoso, complicado. E assim se passaram dez anos.

Até que na última quinta-feira eu me dirigia aos elevadores do trabalho torcendo apenas para que a minha gripe fosse dizimada como passe de mágica quando as portas se abriram e por elas saiu o Fini, setorista do Corinthians. “Domingão somos você e eu no clássico, hein? Se prepara”, anunciou.

Responsável por uma fatia dos outros esportes, não levei muita fé. “Não, cara, tem certeza? Acho que só vai você pro estádio e eu fico na redação”, respondi. “Não, tá lá seu nome e estádio. Você vai”, completou. Claro, dei um sorriso de orelha a orelha e subi para o trabalho.

E a primeira coisa que eu fiz foi pedir para o Mané dar uma olhada na pauta e confirmar. Logo em seguida, ainda tive que ler da Carol Canossa um “eu falei que você ia, mas você tava tão convicto de que não ia...”. Sim, eu sou teimoso.

Até que domingo chegou e eu fui ao Morumbi para o dérbi entre Corinthians x Palmeiras. E como sempre acontece na primeira vez, várias coisas deram errado. A começar pela linha verde do metrô (que deve ter apenas dois trens: um que vai e outro que volta), que quase que me atrasou. Em seguida, a farmácia onde eu compraria o Aturgyl para que eu pudesse respirar apesar do resto de resfriado que ainda permanecia em mim estava fechado. Foi quando eu senti que as coisas não dariam muito certo.

Deixei de ter esse pensamento quando cheguei ao estádio e o trabalho começou. Falar com policiais, esperar desembarque de times, desfalques de última hora... presidente de clube aqui, dirigente acolá. Teve até apresentação de carro de corrida. Em meio a tanta correria, esqueci que o dia conspirava contra mim.

Até que a partida começou. Insossa. E não demorou muito tempo para eu tentar ajeitar o sinal do radinho de pilha que me auxiliava e ver que a anteninha tinha ficado na minha mão. Alguns minutos depois, uma outra parte do rádio se quebrou sem mais nem menos. E antes mesmo do intervalo um dos falantes do meu fone de ouvido mambembe foi pro beleléu sei mais nem menos. Depois do intervalo, pra ajudar, o Corinthians ainda marcou um gol, que foi anulado.

Estava certo de que aquele não era o meu dia quando olhei meu cronômetro, que marcava 28 minutos do segundo tempo no mesmo instante que o placar indicava 0 a 0. Mas não demorou muito para eu ver que estava enganado: dois minutos depois sairia o gol da vitória do Palmeiras. Enquanto o Valdívia comemorava descontroladamente no gramado, eu vibrava silenciosamente em uma cabine no meio da torcida corintiana. Quase que uma tortura.

Então o clássico acabou. Entusiasmado, saquei o telefone do bolso a caminho da sala de imprensa e comemorei a vitória, o gol, o trabalho, o dia, a noite... o final de semana inteiro, tudo. E já nem me lembrava mais que não tinha mais fone de ouvido e nem radinho de pilha. Sabia apenas que estava feliz.

sábado, 1 de março de 2008

Dificuldades de relacionamento

Minha timidez é algo quase do passado. Ultimamente, apenas fiz uso dela como um pouco de charme, confesso. Mas isso não quer dizer que a minha capacidade de comunicação com as pessoas em geral tenha melhorado e chegado a um ponto próximo do ideal.

Instantes atrás, por exemplo, notei que ainda tenho muito a melhorar. Tomando um copo d’água à beira do CCT da Barra Funda do São Paulo, tento puxar papo com um cara ao meu lado. Simpático, respondeu logo de cara. “Yo soy de Italia, de Lugano, proximo a Milano”. Maravilha. Adoro trocar uma idéia ou outra com estrangeiros.

Apresentamo-nos e a pergunta que ele, que disse ser amigo pessoal do Adriano, logo me fez: “Que acha de Adriano?”. Minha cabeça deu um nó e imaginei uma resposta em português, uma em espanhol, uma em italiano e outra em inglês. Acabei falando todas ao mesmo tempo. “Humm, yo creo que vá bene, but... queria mucho que él se acertasse, pero... está dificile, muito dificile”.

É claro que a reação do cara não foi outra a não ser dar uma risada da minha cara. Corei, sorri e me expliquei. “Perdone, pero yo no hablo... digo, yo no parlo italiano”. Ele foi empático. “Parla español?”. “Mezzo punto”. “Yo compreendo la mistura de português y español, no hay problemas”.

Acabei aproveitando a oportunidade para praticar o meu fraquíssimo espanhol estilo ‘engana cabrón’, falei sobre estilos de marcação no futebol, a diferença entre os zagueiros de Milan e Sertãozinho... e, ao final da conversa, o italiano se despediu e eu, automaticamente, respondi “Grazzi”. Com sotaque da Sicília e tudo.

Coisas que só uma manhã de sábado pode proporcionar.